quarta-feira, 28 de março de 2012

Há muitos planetas semelhantes ao nosso e maiores do que o nosso na nossa Galáxia


As super-Terras, planetas um pouco maiores do que o nosso, são muito vulgares na Via Láctea. É a principal conclusão de uma equipa internacional, que inclui os astrofísicos portugueses Nuno Santos e Vasco Neves, além da dupla que descobriu o primeiro planeta de sempre noutro sistema solar, em 1995.

Ao longo de seis anos, a equipa observou anãs vermelhas, as estrelas mais frequentes da nossa galáxia, mais pequenas do que o Sol e boas candidatas para se encontrar planetas. Os resultados, publicados nesta quarta-feira na revista Astronomy & Astrophysics, mostram que 41% destes astros têm super-Terras na zona habitável – a região de um sistema estelar onde é mais provável haver vida.

As observações foram feitas no espectrógrafo Harps, instalado num telescópio que o Observatório Europeu do Sul (ESO) tem em La Silla, no deserto do Chile. Entre Fevereiro de 2003 e Março de 2009, o Harps observou 102 anãs vermelhas e ofereceu uma nova paisagem galáctica aos cientistas.

“Um dos resultados que mais chama atenção é que a frequência de super-Terras à volta das anãs vermelhas é muito elevada”, diz ao PÚBLICO Nuno Santos, do Centro de Astronomia da Universidade do Porto (CAUP), que faz parte da equipa, que inclui Didier Queloz e Michel Mayor, os primeiros caçadores a encontrar planetas extra-solares.

Nove planetas descobertos

Existem cerca 160.000 milhões de anãs vermelhas na Via Láctea, uma centena delas está a menos de 30 anos-luz de distância do Sol. “Quando as estrelas se formam a partir do colapso de uma grande nuvem de poeira, vão produzir-se mais estrelas pequenas do que grandes. Haverá mais anãs vermelhas do que estrelas como o Sol e ainda com mais massa”, explica Nuno Santos.

No espectro luminoso das estrelas, as anãs vermelhas são as que geram menos luz e calor. São mais pequenas do que o Sol e a influência gravítica de planetas hipotéticos que as orbitem será maior. Por isso são um alvo óptimo para a medição do Harps.

O espectrógrafo permite medir a velocidade radial das estrelas e inferir se existem planetas em órbita. Num sistema estelar de apenas um planeta e uma estrela, os dois astros influenciam o movimento um do outro. Apesar de o planeta sofrer um efeito gravítico muito maior, a estrela também é atraída pelo planeta, o que a faz ter um movimento mais circunspecto mas ainda assim mensurável. “Ao medirmos a velocidade da estrela com grande precisão podemos descobrir movimentações periódicas”, explica o astrofísico. É assim que os planetas são denunciados.

O aparelho detectou nove super-Terras, incluindo duas que na zona habitável do seu sistema estelar. Em teoria, nesta zona é possível haver água em estado líquido à superfície de um planeta, o primeiro requisito para a existência de vida como a conhecemos na Terra.

Este resultado provisório das duas super-Terras parece estar longe dos 41% de estrelas anunciados pela equipa. Mas os cientistas sabem que só uma percentagem muito pequena das estrelas está nas condições apropriadas para o Harps encontrar planetas, por isso “o número de descobertas foi corrigido”. Já em relação a planetas gigantes, monstros gasosos como Júpiter, apenas existem em 12% das anãs vermelhas.

Consideram-se super-Terras os planetas que tenham uma massa entre duas a dez vezes a da Terra. A frequência de planetas em ambiente habitável, apesar de estar dentro do esperado pelos modelos teóricos, é um bom prenúncio para a vida. “Não há razão para que à partida não possa haver um planeta com vida em torno de uma anã vermelha”, considera Nuno Santos.

Um dos planetas que causa mais expectativas é o Gliese 667Cc, descoberto pelo Harps e cuja existência foi divulgada em Fevereiro. “Tem uma massa cerca de quatro vezes maior do que a Terra e está realmente no meio da zona habitável. Terá água líquida se tiver a composição química certa. Tem à partida muitas condições para ser habitável”, refere o cientista.

A vida difícil à volta das anãs vermelhas

Mas há muitas questões por responder. As anãs vermelhas são estrelas com menos energia, por isso o calor delas chega menos longe, logo as zonas habitáveis são mais próximas do que por exemplo no nosso sistema solar. “A zona habitável de uma anã vermelha pode estar mais perto da estrela do que Mercúrio está do Sol.”Esta proximidade faz com que corram outros riscos. Por estarem tão perto das suas anãs, os planetas podem não ter um movimento de rotação como o da Terra, e serem como a Lua que apresenta sempre a mesma face em relação a nós. Nesse caso, esses planetas estarão sempre a receber luz de um lado e ficarão eternamente às escuras do outro, o que pode dificultar a presença de vida.

“[Além disso], as anãs vermelhas são conhecidas por sofrerem erupções estelares, que banham os planetas de raios X ou radiação ultravioleta, o que diminui as probabilidades de haver vida”, diz Stéphane Udry, outro dos autores do artigo, em comunicado.

A própria composição dos planetas influencia a possibilidade da existência de vida. A Terra é um planeta rochoso, feito de silicatos com um núcleo metálico. Conhece-se a relação entre a composição do Sol e de estrelas semelhantes, e o tipo de planetas que esta classe produz. No caso das anãs vermelhas, esta relação ainda é uma incógnita, apesar das observações do Harps poderem trazer respostas. “Em estrelas como Sol, quanto mais elementos pesados têm, que não são hidrogénio ou hélio, maior é a probabilidade de se encontrar um planeta gigante. Estamos a perceber se esta relação existe nas anãs vermelhas”, diz Nuno Santos.

A equipa do astrofísico está à espera de 2016 para continuar a busca por planetas do tamanho da Terra. Nesse ano, se tudo correr bem, o espectrógrafo Espresso será instalado no Chile, no maior telescópio óptico do mundo, do ESO. “Como estamos a participar na construção desse instrumento, temos direito a utilizar o Espresso 215 noites”, revela Nuno Santos.

Fonte: Publico

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